Ano passado, em 2019, peregrinei por 315km pelo Caminho de Santiago buscando uma alternativa para algumas dores da minha alma e alguns remorsos de escolhas mal feitas que minha consciência não me permitia esquecer. Espero que você entenda que não me refiro a nada da frescura milenial que é a necessidade de propósito e sentido em tudo.
Pelo contrário – escrevo sobre essa busca, contraditoriamente, de uma forma mais niilista e anarquista. A ausência de sentido também fazia parte da minha busca. Não esperava por um milagre quando parti rumo a Santiago de Compostela. Muito menos por redenção.

O que me levou para lá foi instinto. Um chamado astral/espiritual que projetou em mim a necessidade de preparar um mochilão, dar um beijo de despedida na minha namorada e apertar o botão de pausa na minha carreira de publicitário na merda da sociedade consumista que a gente vive. É, dá para ver que eu andava bem desgostoso com o caminho que minha vida tinha tomado. Foi esse caminho de insatisfações que me levou ao Estranho Caminho de Santiago.
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Confesso que tive medo na hora de partir. Racionalmente achava que tinha tomado uma decisão bem estúpida. Não sou um cara de muitas finanças e foi irresponsável não começar a procurar trabalho depois do término do meu último contrato, ainda mais com a situação econômica do Brasil ultimamente.
Mas, a bem da verdade, foi minha racionalidade a principal culpada pelo caminho que me levou a uma vida infeliz por tanto tempo. Estava na hora de ouvir meu instinto e seguir um sonho louco de quando era jovem e irresponsável. Afinal, como diz o ditado do povo fremen segundo o Messias de Duna, “o mal da verdade é o excesso de análise”.
Apesar do que escrevi no primeiro parágrafo desse texto, quando cheguei em Pamplona, ponto de início da minha peregrinação, me lançava como um touro na vã tentativa de entender porque o Caminho tinha me chamado. Para controlar minha ansiedade, balbuciava bem baixinho as palavras que um sacerdote me disse anos antes na Albânia: “seja paciente com Deus”. Eu tinha esperado tanto tempo para finalmente partir pelo Caminho, logo, poderia esperar mais alguns dias. Quem sabe o que eu encontraria em Santiago de Compostela?
Sabe aquela frase: “a jornada é mais importante do que o destino”. Bom, nas próximas semanas testemunharia ela a prática. Eu me desligaria das redes sociais, conheceria muita gente do bem, escutaria muitas histórias inspiradoras, leria poemas e relatos escritos pelo Caminho, entraria em contato com a Natureza, viveria em comunidade nos albergues e sentiria Deus e o Universo falando comigo de um jeito que não escutava durante anos vivendo no eixo Rio – São Paulo. Quando cheguei em Santiago de Compostela, chorava como um menino. Lá percebi que não foram 15 dias de caminhada. Foram 4 anos.

O Caminho tem um poder ímpar de unir pessoas e passar mensagens. Por onde quer que você olhe durante sua caminhada, verá desenhos e frases que te estimulam a entrar em um estado de espírito de reflexão e positividade. Nas conversas com outros peregrinos você acaba reavaliando o seu próprio Caminho.
E, por onde quer que você passe, alguém vai te saudar com os dizeres: “Buen Camino” (bom caminho), que reforçará esse estado de espírito. Fazer o Caminho de Santiago é praticamente uma experiência alquímica. Você carregará algo dentro de si que será transformado na sua peregrinação. Pelo menos isso foi o que aconteceu comigo.
Eu poderia incluir algumas situações que presenciei e vivi por lá, mas deixo o relato completo para você ler no meu livro BuenCamino pelo link https://amzn.to/2XLcKzc . Acredite, se você pretende partir rumo a Santiago de Compostela, vale a leitura antes de preparar a mochila. Mais do que um livro sobre o Caminho, é um livro que fala sobre o quão bosta é a vida que somos condicionados a levar através do consumo – e as reflexões que minha peregrinação me trouxe sobre o assunto.
Mesmo não compartilhando meus relatos pessoais nesse texto, não posso concluí-lo sem responder à pergunta do título. Então, por que fazer o Caminho de Santiago? Te digo primeiro porque não fazer. Não vá pela natureza, museus, igrejas, obras de arte ou qualquer tipo de atração minimamente turística.

Todos esses itens você pode deixar para outro destino mais interessante. Aliás, deixe o pensamento de fotos incríveis para o Instagram para outra viagem que não seja para o Caminho de Santiago, combinado? Te digo isso porque conheci muitas pessoas que fizeram a peregrinação com essa mentalidade e acabaram se frustrando. Então, já deixo avisado para o mesmo não acontecer com você.
Com isso escrito, estou pronto para te contar o porquê acho que você deve fazer o Caminho de Santiago. Na sua peregrinação você encontrará uma alternativa à vida que a maioria das pessoas leva. Você provavelmente vai vivenciar um cotidiano comunitário.
Por isso, ao invés de um pensamento turístico de fotos individuais e passeios exclusivos, o Caminho oferece uma jornada de trocas, comunhão e relações com outros peregrinos, com a Natureza e com a história dos lugares por onde você passará. Mas você precisa estar aberto para isso. E para entender que existe algo que te levou para lá. Essa compreensão é o maior motivo para você partir pelo Caminho de Santiago.
Se você sente que o Caminho está te chamando, prepare a mochila porque ele tem algo guardado para você. Eu encontrei algo para mim como escrevi no meu livro. Tenho certeza que se você leu esse texto até aqui e quer fazer sua peregrinação, vai encontrar algo por lá também. Buen Camino!